Sistema
Stanislavski
Sistema Stanislavski consiste numa série de
procedimentos de interpretação do ator e da atriz desenvolvido na arte
dramática pelo teatrólogo, diretor e actor russo, Constantin Stanislavski, no
final do século XIX e começo do XX. O sistema, como é chamado, é uma das
principais sistematizações para o desenvolvimento da interpretação do ator e é
muito utilizado no cinema.
Esta sistematização encontra-se nos livros Minha
Vida na Arte (Moia Zhizn v Iskusstve 1925), tradução ao português direto do
russo, A Preparação do Ator (Rabota Aktera nad Soboj - v tvortsheskom protsesse
perezhivanie. Tshast 1 1938 - O Trabalho do Ator sobre si Mesmo - Parte 1), A
Construção da Personagem (Rabota Aktera nad Soboj - v tvortsheskom protsesse
voploshshenija. Tshast 2 1948 - O Trabalho do Ator sobre si Mesmo - Parte 2) e
A Criação de um Papel (Rabota Aktera nad Rolju 1957 - O Trabalho do Ator sobre
seu Papel). Infelizmente a maioria das traduções brasileiras são traduções da
edição ao inglês de Elizabeth Reynolds Hapgood, as quais simplificam, omitem e
reorganizam nem sempre de forma correta o original russo. A partir de 2000
novas traduções de Jean Benedetti ao inglês (Routledge) e de Carlos Saura ao
espanhol (Alba), seguem os originais russos completos.
Histórico
O sistema surgiu como resultado das dúvidas que o
jovem Stanislavski tinha em relação ao trabalho apresentado por grandes actores
do seu tempo, e a quem admirava, como Maria Yermolova e Tommaso Salvini. Esses
atores pareciam operar num padrão distinto de todos os demais e, ainda assim,
pareciam estar subordinados a momentos de inspiração, quando atuavam, ao passo
que em outras seus desempenhos pareciam apenas razoáveis ou meramente precisos.
Stanislavski considerava a atuação de Yermolova
como o ápice da arte cênica. Então, passou sua vida a sistematizar um conjunto
de regras, diretrizes e exercícios que pudessem dar a qualquer actor o
"instrumento" com o qual pudesse atuar de forma melhor possível, além
de conseguir o total controle físico sobre si mesmo.
O sistema versus o Método
Stanislavski e seu sistema são freqüentemente
confundidos com o método de atuação proposto pelo Actors Studio de Nova York e
com outras técnicas desenvolvidas a partir do sistema por atores nos Estados
Unidos. O método, como é conhecido, foi desenvolvido nos palcos
norte-americanos, principalmente em Nova York nas décadas de 1930 e 1940. Os
atores de teatro Elia Kazan, Robert Lewis, Lee Strasberg, primeiro no Group
Theatre e depois no Actors Studio, desenvolveram uma forma particular do
sistema a partir dos ensinamentos de Lee Strasberg no American Laboratory
Theatre em 1920, focalizando principalmente nas necessidades psicológicas dos
atores norte-americanos contemporâneos.
Aspectos dos estudos de Stanislavski sobre o
realismo psicológico e a vivência de emoções autênticas em cena atraíram estes
artistas. O método foi introduzido inicialmente em encenações da nova
dramaturgia norte-americana da época: Clifford Odets, Arthur Miller e Tennessee
Williams.
Enquanto o sistema de Stanislavski e o método de
Strasberg tem semelhanças, eles diferem imensamente. O método emprega uma
ênfase excessiva na memória emocional, reconstruindo a experiência pessoal dos
atores para uso na representação. Stanislavski, ao contrário, achou menos
efetivo este acesso a emoção pessoal que outras técnicas desenvolvidas
posteriormente. Stanislavski considerava a memória emotiva como uma técnica
útil, mas a usava com cautela.
Elementos do sistema são constantemente
confundidos também porque Stanislavski, durante sua vida, ensinou e
reelaborou-o muitas vezes, considerando-o um acesso a inúmeras possibilidades
de interpretação, podendo ser aplicado a diferente estilos da arte, dependendo
dos problemas que podem surgir em diferentes peças de teatro.
Antes da atuação
Constantin Stanislavski chegou à conclusão de que
o actor deve parecer o mais possível com a vida real. Quando papel e actor
estão conectados, o papel ganha vida - e o que se faz necessário é constituir
uma técnica capaz de possibilitar que isto sempre ocorra. Para tanto, ensinava
que: Esqueça de tudo, deixe fluir, mas lembrem-se: isto pode acontecer algumas
vezes em sua carreira, ou mesmo nunca. O que existe é técnica. Todo o resto
depende da forma (particular) com que você atua. Isso certamente depende de
como o actor se aproxima do seu papel, do quanto "ama" o seu papel.
Embora Stanislavski não tenha sido o primeiro em
sistematizar a forma de atuação (a Era Vitoriana foi profícua em livros para
actores), foi sem dúvida o primeiro a relacionar à arte sua significação
psicológica - na verdade começou a fazê-lo antes mesmo de a psicologia ser
melhor compreendida e formalizada como ciência. Desde sua criação, seu sistema
influenciou profundamente a arte teatral, e seu criador nunca abandonou a visão
sobre o desempenho realístico junto ao amor pela arte.
O Sistema consiste num método complexo para
produzir a atuação realística; a maioria dos bons actores atuais (quer do
teatro, cinema ou televisão) devem a este aprendizado parte do sucesso que
alcançam. Usando o Sistema, uma actor é levado a proceder a uma profunda
análise de si mesmo, bem como ao conhecimento do seu personagem. O actor é
levado a descobrir os objetivos do personagem a cada cena, dentro do
objetivo-geral da peça inteira.
Uma forma de se conseguir isto era o
"segredo" de Stanislavski. Exigia que os actores fizessem inúmeras
perguntas sobre seu personagem. Por exemplo, uma das primeiras perguntas que o
actor deve fazer, antes de atuar, é: O que eu faria, se estivesse na mesma
situação que o meu personagem?.
Progressão do Sistema Stanislavski
O Sistema Stanislavski, muitas vezes, confunde-se
com o Método de Atuação, em parte por conta de alguns discípulos, como Stella
Adler que, depois de uma curta estadia com Stanislavski na Europa, levou esta
experiência para Nova Iorque.
O fato é que Stanislavski defendia uma constante
progressão de seus métodos, chegando mesmo a constar, no folclore que cerca sua
figura, o caso em que, tendo uma actriz lhe perguntado sobre o que poderia
fazer com as anotações que durante anos fizera de suas lições, respondera-lhe
para as queimar todas. Verdadeira ou não, essa história ilustra a intenção do
mestre. O que ele realmente se dedicava era a criar um sistema verdadeiramente
executável pelos actores, ou seja, algo que estes de fato pudessem usar. O
incessante reaprendizado foi uma constante ao longo de sua vida.
O Sistema das Ações Físicas de Stanislavski,
segundo Grotowski
As ações físicas talvez sejam o principal legado
de Stanislavski, muito discutidas até os dias de hoje. Jerzy Grotowski em seu
artigo Sobre o método das ações físicas afirma que "para Stanislavski a
emoção é independente da vontade". Grotowski explica "Quero amar uma
pessoa mas não posso amá-la". Assim o que depende de nossa vontade para
Grotowski "são apenas as pequenas ações, pequenas nos elementos de
comportamento" e com elas o ator deve trabalhar.
“ eu penso no canto dos olhos, a mão tem um certo
ritmo, vejo minha mão com meus olhos, do lado dos meus olhos quando falo minha
mão faz um certo ritmo, procuro concentrar-me e não olhar para o grande
movimento de leques (referência às pessoas se abanando no auditório) e num
certo ponto olho para certos rostos, isto é uma ação. Quando disse olho,
identifico uma pessoa, não para vocês, mas para mim mesmo, porque eu a estou
observando e me perguntando onde já a encontrei. Vejam a posição da cabeça e da
mão mudou, porque fazemos sempre uma projeção da imagem no espaço; primeiro
esta pessoa aqui, onde a encontrei, em qualquer lugar a encontrei, qualquer parte
do espaço e agora capto o olhar de um outro que está interessado e entende que
tudo isso são ações, são as pequenas ações que Stanislavski chamou de físicas.
Sobre o método das ações físicas ”
Assim Grotowski afirma que ações físicas de
Stanislavski não são apenas sentimentos, mas o que é operacionalizável nas
categorias físicas. É nesse sentido que Stanislavski fala de ações físicas,
"não é sugestivo, mas que se pode captar do exterior" (Sobre o
Método...).
E Grotowski avança para explicar o que não são
ações físicas. Em seu ponto de vista
“ Atividades não são ações físicas, como limpar o
chão, lavar os pratos, fumar cachimbo, não são ações físicas, são apenas
atividades. Mas a atividade pode se transformar em ação física. Por exemplo, se
vocês me colocarem uma pergunta muito embaraçosa, que é quase sempre a regra,
eu tenho que ganhar tempo. Começo então a preparar meu cachimbo de maneira
muito "sólida" (pensando na pergunta, em como respondê-la, ou como
sair da situação). Neste momento vira ação física, porque isto me serve neste
momento. Estou realmente muito ocupado em preparar o cachimbo, acender o fogo,
assim DEPOIS posso responder à pergunta.Sobre o método das ações físicas ”
E continua o famoso ator polonês, explicando mais
detalhadamente utilizando agora uma cena de Romeu e Julieta.
“
Ações físicas não são apenas gestos. Os atores
normalmente fazem muitos gestos pensando que este é o mistério. Existem gestos
profissionais - como os do padre. Sempre assim, muito sacramentais. Isto são
gestos, não ações [(físicas)]. (...) O ator que representa Romeu de maneira
banal fará um gesto amoroso, mas o verdadeiro Romeu vai procurar outra coisa;
de fora pode dar a impressão de ser a mesma coisa, mas é completamente
diferente. Através da pesquisa dessa coisa quente existe como que uma ponte, um
canal entre dois seres, que não é mais físico. Neste momento Julieta é amante
ou talvez seja uma mãe. Também isto, de fora, dá a impressão de ser qualquer coisa
de igual, parecida, mas a verdadeira reação é ação. O gesto do ator Romeu é
artificial, é uma banalidade, um clichê ou simplesmente uma convenção, se
representa a cara de amor assim. Vejam a mesma coisa com o cachimbo, que por si
só é banal, transformando-a a partir do interior, através da intenção - nesta
ponte viva, a ação física não é mais só um gesto. Sobre o método das ações
físicas
”
Finaliza Jerzy Grotowski então sobre o GESTO nesta
palestra proferida no Festival de Teatro de Santo Arcangelo (Itália), em junho
de 1988.
“ O gesto é uma ação periférica do corpo, não
nasce no interior do corpo, mas na periferia. Por exemplo, quando os camponeses
cumprimentam as visitas, se são ainda ligados à vida tradicional, o movimento
da mão começa dentro do corpo (Grotowski mostra), e os da cidade assim
(mostra). Este é o gesto. Ação é alguma coisa mais, porque nasce no interior do
corpo. Quase sempre o gesto encontra-se na periferia, nas "caras",
nesta parte das mãos, nos pés, pois os gestos muito freqüentemente não se
originam na coluna vertebral. As ações, ao contrário, estão radicadas na coluna
vertebral e habitam o corpo. Sobre o método das ações físicas
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